quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Terremoto, Fronteira da Ciência

A propósito da tragédia ocorrida ontem no Haiti, a Times publicou hoje em sua página eletrônica, artigo assinado por Jeffrey Kluger. Por considerar o texto bem esclarecedor, fiz essa versão resumida para a língua portuguesa.

Poderia o terremoto do Haiti ter sido previsto?
*

Não há dificuldade em estimar as perdas materiais e humanas do terremoto que atingiu o Haiti ontem, considerado o pior da região nos últimos cem anos. Mas, nessas horas, considerando a antiguidade com que o homem convive com esse tipo de desastre natural, é quase certo que nos perguntemos: não haveria alguma forma, alguma técnica ou tecnologia que previsse com antecedência o evento, reduzindo assim o sofrimento e a devastação?
Infelizmente estamos bem distantes de detectar um terremoto a tempo de remediar as tragédias que provocará. Hoje, a principal pergunta dos cientista é compreender o que leva um tremor de terra desenvolver-se de forma insidiosa, quase em silêncio, e, ao entender melhor o fenômeno, pesquisar e desenvolver tecnologias que permitam a identificação o mais precoce possível do fenômeno.
O terremoto do Haiti, com 7,0 graus na escala Richter, reúne características que poderiam garantir algum grau de previsibilidade. O pequeno pais insular está assentado sob duas placas tectônicas em permanente tensão, na falha geológica Plantain Enriquillo Jardim, delimitada pela confluência das placas norte-americana e caribenha . Para o geofísico Michael Blanpied do Centro Norte-Americano de Pesquisas Geológicas (USGS), essas placas ao se moverem num deslocamento latero-lateral, provocam o esmagamento, a ruptura e a explosão do solo da ilha, configurando o que tecnicamente é denominado terremoto strike-slip.
É claro que temos tecnologia para monitorar o estresse acumulado durante anos ou séculos entre as placas, mas os sismógrafos quase nada contribuem para definir o momento exato em que o tenso equilíbrio geológico é rompido e as forças do terremoto derivam seu poder destrutivo em direção a superfície da Terra. "Podemos produzir informações gerais sobre terremotos", diz Blanpied. "Nós observamos as falhas e os padrões locais de terremoto ao longo dos anos, e somos capazes de concluir onde há maior probabilidade de ocorrência.
Na verdade, os geofísicos, tão recentemente quanto em 2008, previram uma zona de falha no lado sul da outrora chamada Ilha da Hispaniola, no Haiti, onde existiriam evidências suficientes para considerá-la como foco de "um grande risco sísmico". O problema é que a previsão não faz as pessoas afastarem-se da zona de perigo. “Se assim fosse, ninguém iria viver na Califórnia ou na Cidade do México ou no Japão. O que hoje precisamos é da previsão em curto prazo, na ordem de semanas, dias ou horas”.
Na década de 1980, por exemplo, o USGS e o governo da Califórnia acompanharam um trecho particularmente instável da falha de San Andreas, perto da cidade de Parkfield. Abalos sísmicos vinham ocorrendo nesta área a cada 20 ou 25 anos ou mais. O anterior havia ocorrido em 1966, com a previsão de que outro atingiria a região por volta de 1990. Apesar de toda a infraestrutura instalada para identificar com precedência, o terremoto nunca ocorreu na década de 1980, nem nos anos 1990. Em 2004 a terra tremeu de novo, o que previu todo o hardware de alta tecnologia ali instalado? Nada.
"Capturamos apenas informações quando o terremoto já estava em curso", diz Blanpied. "Mas o solo não deu nenhuma indicação de um prenúncio ou um sinal elétrico ou um sinal de água ou qualquer outra coisa, que nos dissesse da iminência do fenômeno. Esse fato demonstra para nós o que já sabemos de antemão: Predição de terremotos em geral é muito difícil."
Isso não quer dizer que a ciência não tenha progressos na área. Instrumentos que detectam as ondas P são um bom exemplo. Abalos sísmicos em geral provocam dois tipos de vibrações a partir do seu epicentro: as ondas de corpo, que se distribuem no interior da Terra, e as ondas de superfície, que se movem para cima. A onda P é mais veloz que a primeira e são por primeiro detectadas nos sismógrafos, sem dar contudo certeza de que haverá uma catástrofe. Entretanto, na Califórnia, as linhas de gás de muitos lares estão agora equipadas com sensores para detecção de ondas P, para desligar a válvula de escoamento e assim prevenir incêndios e explosões diante de um abalo grave.
No atual estado da arte da ciência, o melhor que os governos podem fazer é fortalecer a rede global de sismógrafos e outros instrumentos, para criar o melhor mapa sismológico do planeta, melhor informando quais os locais de maior risco e a severidade dos terremotos. Isso pode ajudar a elaboração de políticas públicas que definam códigos adequados de construção, reforçando a infra-estrutura e o zoneamento de áreas impróprias para ocupação urbana, assim como a elaboração de planos para evacuação da população em risco e o atendimento de feridos.

*texto baseado no original publicado na página eletrônica da Times

2 comentários:

[Trans]formação disse...

Gostaria de agradecer o autor por ter traduzido o texto para português. Fiquei intrigado com o fato de que o terremoto no Haiti não ter sido identificado com uma antecedência mínima, uma vez que o páis não está tão longe dos EUA e, portanto, poderia ter se beneficiado de possíveis detetores instalados naquele país.

Itajaí disse...

Fico satisfeito que o texto tenha alcançado o objetivo de esclarecer um assunto que sempre está na pauta da mídia.
Obrigado por sua visita e comentário.