O Brasil aumentou seu desempenho em ciência e tecnologia. Conforme anunciado pelo Ministério de Educação nesta semana, o país é o décimo terceiro colocado na classificação mundial de produção científica, integrando um seleto grupo de megaprodutores de ciência como Estados Unidos, Inglaterra, França, Canadá, Austrália, China e Índia. O Brasil ficou a frente da Rússia, outrora poderosa nação de perfil científico-tecnológico, especialmente na área militar, quando disputava como URSS a hegemonia política mundial com os EUA.
Esse impressionante salto olímpico brasileiro na produção científica é marcada por um aumento de 56% no total de artigos publicados, conforme identifica a bibliometria do Web of Science: saltamos de 19.436 artigos científicos publicados em 2007 para 30.415 em 2008. Esse fato inquietou o jornalista científico Marcelo Leite, do jornal Folha de São Paulo, que no artigo Zebras e Cavalos** indaga qual a explicação para esse desempenho. Ainda que não contradiga o fato, nem ofereça uma resposta definitiva que o explique ao leitor , o jornalista paulista argumenta que a inaudita produção está relacionada a que o Web of Science ampliou sua base de dados e incluiu mais revistas científicas brasileiras, sugerindo com esse argumento que o noticiado é passível de ser entendido como o mais do mesmo.
Decerto não será esta a resposta que fará distinguir as zebras dos cavalos, figura a que recorre o jornalista para ilustrar a precedência explicativa do simples sobre a exceção, conforme recomenda a velha máxima dos clínicos avessos ao estilo bombástico de House. Contudo, para que o conselho hipocrático se imponha, é absolutamente necessário que o indagador explore todas as possibilidades simples antes de concluir que raridades estejam implicadas na causa do fenômeno que desafia a explicação. Assim, com respeito a pergunta sobre a causa do Brasil estar publicando mais artigos científicos atualmente, para que a respondamos de modo criterioso, devemos considerar as políticas públicas que certamente estão implicadas no desempenho elogioso da pesquisa no país, e que Leite não considera no artigo publicado no domingueiro caderno Mais.
A exemplo do quanto políticas públicas são importantes para evitar equívocos de análise, nos últimos oito anos ,o Ministério da Ciência e Tecnologia, o Ministério da Saúde, Fundações de Amparo à Pesquisa e Secretarias Estaduais de Ciência e Tecnologia iniciaram um movimento de verticalização do financiamento à pesquisa em saúde que derivou em investimentos na ordem de mais de 500 milhões de reais entre 2003-2009 para financiamento de quase 2500 projetos. Comparativamente a 2002 o crescimento é exponencial, se olharmos que naquele ano o total investido pelo Ministério da Saúde arredondava algo em torno de 100 mil reais para o financiamento de meia dúzia de pesquisas.
Compreende o óbvio que esse investimento setorial na pesquisa levou a um conjunto de derivadas em que estão incluídas a produção de dissertações e teses de mestrado, doutorado, pós-doutorado e um conjunto de artigos científicos a elas diretamente referenciados. Tal esforço para fortalecer a pesquisa em saúde também foi organizado em campos até então inéditos no histórico institucional do Ministério da Saúde. Em parceria com a farmacêutica Roche, foram selecionadas e levadas a Lausanne (Suíça) um grupo de pesquisadoras brasileiras para estágio de pós-doutorado, ainda em curso, e, em abril passado, os Ministérios da Educação e da Saúde celebraram convênio para lançamento de edital conjunto para financiamento de mais bolsas de pós-doutorado na área da saúde que, em nove anos, garantirá recursos na ordem de 75 milhões de reais.
Contudo, enquanto o perfil de produção científica ascendente se consolida, por outro lado, não demonstramos a mesma competência em levar o conhecimento científico ao mercado. Conforme demonstra o gráfico acima*, publicamos sempre muito, mas patenteamos muitíssimo menos. Este, hoje, constitui um grande desafio para os gestores de políticas públicas em ciência, tecnologia e inovação no Brasil. E requer remédios cavalares que nos garantam não só a fama de país pesquisador, mas de país inovador pelo impacto que o segundo perfil possui para positivar nossa balança comercial em alguns produtos estratégicos para o setor saúde.
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** Acesso on line apenas para assinantes da Folha de São Paulo ou do provedor UOL.
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