sábado, 2 de maio de 2009

Nomear É Dizer Além do Nomeado
















Estátua de Girolano Fracastoro (H. Fracastorio) em Verona (Itália).

Como símbolo de poder tem à mão direita o globo.

A recente orientação da Organização Mundial da Saúde - OMS quanto a renomear a gripe suína para influenza A (H1N1), atendendo à solicitação da industria da suinocultura, faz-me lembrar um outro episódio que em muito esclarece como as doenças são designadas. Ensina a História da Medicina que foi assim, por exemplo, com a sífilis. Durante muito tempo as academias de ciência européias debateram se essa doença sexualmente transmissível (DST) seria originária das Américas, e houve até quem culpasse as lhamas como possíveis responsáveis pela transmissão.
Mas a argumentação da origem americana tem origem no fato de ao sitiar Nápoles o exército francês, composto de alguns egressos da frota de Colombo, não fora derrotado pelos napolitanos mas sim por uma feroz epidemia de sífilis que, naquela altura, especula-se, tinha virulência para ser transmitida não necessariamente só por contato sexual. Claro que os franceses não perderam tempo e logo passaram a designar a sífilis como o mal napolitano.
A sabedoria francesa parece fez sucesso, e conforme sucediam os conflitos militares entre os estados europeus a doença mudava de nome: na Inglaterra era chamada de doença espanhola, e na terra de Goya e do Quijote recebia o apelido de doença inglesa. Contudo, entre as mais elaboradas iniciativas de nomear a sífilis, destacou-se a do médico e poeta Girolano Fracastoro, que, em 1530, compos o célebre poema Syphilis sive morbus Gallicus, uma descrição clássica e diria eu quase perfeita desta DST. Mas atentemos ao significado das palavras morbus Gallicus: quer dizer Mal Gálico, da Gália, doença francesa portanto. Fracastoro inovou, mas nem tanto quando cedeu a um certo belicismo e referiu ao inimigo francês a origem da sífilis.
Mas de retorno ao caso da gripe suína, parece-me que igual cuidado de redefinição não houve com respeito à gripe aviária. Talvez porque as galinhas não tenham as defesas que os porcos possuem. Pois assim é que saímos dos cenários de capa e espada, da lavra de poemas em métrica latina, para chegarmos aos embates da fria métrica das bolsas em assombros de crise econômica internacional. Com o devido desconto das diferenças entre séculos, não arriscaríamos muito se concluíssemos que, nestes dias, em termos de batismo de doenças ,
faz hoje a economia política as vezes de pia batismal .

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