sábado, 14 de agosto de 2010

Científico

Se em 1890 eu descobrisse um novo corpo simples em certo
mineral brasileiro,
o chamaria de nastúrcio,
determinaria provisoriamente seu peso atômico
e, tratando o cloreto com potássio,
o obteria, prévia lixiviação, em estado pulverulento.
Repetida a experiência frente a uma comissão de inimigos a serem
designados pela academia,
o nastúrcio adquirirá cidadania,
sua posição irá se definindo:
Entre o ósmio sintético e o molibdênio aberrante,
sob uma chuva de felicitações
- primeiro elemento que reside numa ponte de Rialto entre outros
dois
e, de repente, a tabela periódica não é mais plana, nem por
capricho.
Merece o descobridor a ordem do dragão aterrorizado?
Chova ou troveje! E no futuro teremos
como um grosso rato formado na farinha
e que nela vive sepultado, movimentando-se pouco,
quase sem respirar, longevo, sem ler.

Tradução: Odile Cisneros

O poeta é o químico espanhol, mas naturalizado mexicano, Gerardo Deniz (1934), cuja obra transmuta o vocabulário científico e a erudição linguística e mitológica numa insólita e irônica visão da realidade. A poesia foi publicada em "Sibila - Revista de Poesia e Cultura" (num. 6, 2004. Ateliê Editorial).

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