sábado, 5 de maio de 2012

O que Vemos Independe do que Acreditamos?

No que respeita a relação entre observador e objeto, aprendi outro dia uma pergunta que nos questiona se o que vemos independe do que acreditamos. O questionamento porta uma inquietação fascinante, pois dimensiona que o registro fotográfico não deriva da situação topográfica do observador, ou do ângulo em que enquadrou o objeto para registro. Está para além disso, porque situa o ato fotografíco no contexto de um duplo ato político e ideológico: no registro de quem o faz  e na reação de quem o olha. Em literatura, tem correspondência com a metáfora de Júlio Cortázar, quando certa vez disse que ler é sobretudo por o dedo no gatilho. No dizer de Cortázar ler é tomar posição para a ação, que principia na relação estabelecida entre o autor e o leitor. 
A fotografia em definitivo incorporou-se ao cotidiano na medida em que foi absorvida como inovação incremental dos aparelhos para telefonia móvel. Aparelhos celulares e uma variedade de substratos físicos e voláteis, como as páginas eletrônicas na rede mundial de computadores, usadas para registro das imagens registradas estão disponíveis para os usuários. Nesse contexto, nunca o instantâneo (still) foi tão soberano quanto nesses quase dois séculos de uma tecnologia a serviço de uma arte que, por natureza e finalidade, responde à inquietude e à velocidade da modernidade e do capitalismo.  Bem exemplifica esses dois imperativos históricos à fotografia, o campo de teste que representou a Guerra do Afeganistão para a Canon 5D MII e a ligeira G10 da mesma marca, apesar do equipamento fotográfico com melhor desempenho de resistência tenha sido a do iPhone, por ser selado e resistir ao empoeiramento próprio da região.
Em sendo o fotográfico ideológico para quem o registra e para quem o observa, a memória representa seu espaço de resistência e de translação entre gerações. Cada indivíduo em potencial representa um potencial de transporte da imagem, ao modo como Ray Bradbury  descreveu com relação aos livros numa sociedade totalitária, no clássico da ficção científica Fahrenheit 451. Indaguei-me então quais seriam as imagens fotográficas representativas de testemunho de violência, observadas entre a minha infância tardia e a idade adulta, mas sempre contemporâneas, que eu seria capaz de extrair de memória de imediato, sem reflexão, ao modo parecido com aquele teste associativo de palavras.  Como expressão do poder da fotografia e confirmante da relação ideológica perene entre fotógrafo e observador, foram essas as que emergiram da memória:

Guerra do Vietnã, conforme a vi nas páginas da revista Cruzeiro, ainda menino



A destruição à bomba dos Budas Bamiyan (Afeganistão) pela milícia Talebã. O conjunto dessas estátuas foi considerado Patrimônio da Humanidade. O ato destrutivo desses milicianos revela a insubsistência secular da palavra frente a intolerância e a violência do sectarismo religioso.


O Pará como expressão nacional violências no campo: Serra Pelada e o Massacre de 21 trabalhadores rurais em Eldorado dos Carajás seguem gritanto por justiça social, no registro de Sebastião Salgado.


 



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