sábado, 19 de maio de 2012

Nanotecnologia Sem Tecno-Romantismos

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Nada é estável no mundo: o alvoroço é a nossa única música.
poeta John Keats, em carta ao irmão (1818)

O termo nanomedicina gramaticalmente é uma composição por aglutinação. O signficado do termo não remete, entretanto, à definição de uma subespecialidade médica, mas sim à aplicação da nanotecnologia no desenvolvimento de soluções aplicáveis às questões da medicina. É, portanto, um campo do conhecimento de extensa transversalidade criadora, que progressivamente sai da zona cinzenta da fronteira tecnológica e se consolida como inovadora para o mercado, aos moldes shumpeterianos.
Neste primeiro semestre de 2012, foi publicado no Journal of Drug Delivery - uma publicação científica de acesso aberto - o interessante artigo Nanotechnology and Medicine: From Inception to Market Domination, assinado por um grupo de pesquisadores dos EUA e Itália. Trata-se de um artigo fundamental, ao modo de roadmapping, que consolida questões importantes relacionadas a pesquisa, ao desenvolvimento e a inovação nanotecnológica e o mercado de produtos de saúde. 
Nesse sentido, os autores se propõem a descrever decisões financeiras e estratégicas de nanomedicina em fase de arranque para chegar ao mercado com sucesso, de modo a construir e manter uma vantagem competitiva defensável frente a outras tecnologias. Esse processo envolve a avaliação detalhada dos potenciais econômicos dos produtos finais, em que se incluem pesquisas para identificar segmentos de mercado, tamanho, estrutura e concorrentes, assim como a definição do momento de entrada possível no mercado e a fração de comércio que as empresas podem realisticamente alcançar em diferentes horizontes temporais. 



O fato concreto é que a nanotecnologia está na agenda de interesses estratégicos dos governos nacionais e recursos de investimentos, não raro binacionais, têm sido regularmente publicizados na imprensa leiga, tanto no que respeita ao aporte financeiro à linhas de pesquisa e desenvolvimento, ou a estruturação de centros de pesquisa nanotecnológica. Calcula-se que o investimento global em nanotecnologia, incluindo os setores público e privado, supere a cifra espetacular de 13 - 14 bilhões de dólares ano. EUA, União Européia, Alemanha, Japão, Coréia do Sul e a República Popular da China são os que mais expandem seus financiamentos para levar produtos nanotecnológicos ao mercado. 

 Number of nanotechnology patents published by the US Patent and Trademark Office (USPTO), European Patent Office (EPO) and Japan Patent Office (JPO) according to publication date


No caso do Japão, país onde empreendedorismo, inovação e crédito representam um princípio de estado, há nítidos movimentos no sentido de constituir uma rede internacional de pesquisa e desenvolvimento em nanotecnologia com pontos de apoio no Oriente Médio. Por sua vez, governo chinês tem demonstrado grande interesse em Nanotecnologia pelo potencial transformador da indústria das áreas médica, farmacêutica e de meio ambienteSó em termos de recursos para pesquisa e desenvolvimento de nanoalimentos, calcula-se que os chineses deverão ter investido até 2010 cerca de 20,4 bilhões dólares/ano, numa taxa avassaladora de crescimento que vai a cerca de mais de 30% ano.
E o Brasil onde fica nesse agito todo? 
O reconhecimento da nanotecnologia como área estratégica do conhecimento e portadora de futuro, no horizonte econômico de médio e longo prazo, existe desde o governo Lula, e tem sido mantido na agenda governamental da presidente Dilma Roussef. Decorridos quase uma década foram organizados dez Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT) com foco em Nanotecnologia. Entretanto, o calcanhar de Aquiles da iniciativa governamental resulta de pelo menos dois tendões enfraquecidos, que também funcionam em outras áreas como freio à aceleração do investimento em Ciência, Tecnologia e Inovação: o desânimo do empresariado brasileiro para o empreendedorismo científico e a baixa produção de patentes, ambos tendências históricas de retração para o Brasil tornar-se jogador global em dois  cenários de permanente instabilidade criadora: a ciência e o mercado.
No governo Lula, o Brasil buscou soluções econômicas com matizes neokeynesianos, tirando do estado de pobreza, por meio de programas de transferência de renda e a criação de 18 milhões de novos postos de trabalho, um contigente de brasileiros equivalente a população da Argentina. É tempo do governo Dilma agregar ao programa de desenvolvimento do país estratégias shumpeterianas que impulsionem ao mercado a ciência e a tecnologia que vêm se acumulando na academia, ainda que a conjugação de Keynes e Shumpeter, no atual cenário internacional da economia, seja um desafio para poucos.

2 comentários:

L.A.Muehlmann disse...

Realmente ainda não há um impulso natural à transferência de tecnologia tupiniquim ao mercado. O meio acadêmico ainda parece existir para si mesmo. É uma flor que ninguém vê e que se não for regada pela verba pública seca. Fazemos pesquisa de qualidade aqui, falta fazer com que ela sirva nossa economia. O discurso de quem vê nisso uma ameaça à liberdade acadêmica e à qualidade de seus estudos está um tanto desvinculado da realidade. Países como os EUA e a Alemanha fazem ciência de ponta, de qualidade invejável...e são os que mais a estendem à sociedade, tornando-se potencias industriais sólidas. São várias as obstruções no canal entre academia e mercado aqui no Brasil, um deles é a mistura de morosidade, indolência e irracionalidade do nosso sistema patentário.

Ótimo artigo. Parabéns!

Itajaí disse...

Obrigado Luiz, vamos continuar atentos e contribuir.