A Procissão de São Isidro. Goya (Museu do Prado, Espanha)
Nessa coletânea poética de temática social, Ruy
Barata comparece com dois longos poemas de trincheira – “Canção do Guerrilheiro
Torturado”e “Canção do Poeta Vigiado pela Policia”. Neste último, lemos ao modo de
epígrafe o seguinte trecho de relatório ao secretário de Segurança
Pública do Pará, remetido pela Delegacia da Ordem Política e Social – o famigerado Dops, que veio a se tornar um dos braços civis mais repressivos dos governos miltares instaurados depois do Golpe de 64:
“ESTA DELEGACIA EXERCE OBSERVAÇÃO
E VIGILÂNCIA SOBRE ELEMENTOS SIMPÁTICOS À REVOLUÇÃO CUBANA, FACE À EXISTÊNCIA
DE MOVIMENTO DE SOLIDARIEDADE ENCABEÇADO POR ELEMENTOS RECONHECIDAMENTE COMUNISTAS”.
Muito antes de concluir que “O
tempo tem tempo de tempo ser/ O tempo tem tempo de tempo dar/ Ao tempo da noite
que vai correr/ O tempo do dia que vai chegar", o letrista de Pauapixuna registra
a certa altura a farsa encenada pelos que vigiam o poeta resistente:
O olho confina o mundo
do poeta confinado.
Se anda – o olho caminha,
se para – o olho é parado.
Se entra no Bar e senta
o olho fica sentado.
O olho cheira, investiga,
o trago a ser emborcado.
Se for uísque (o sem selo)
o olho fica fechado.
Quando 50 anos depois arautos do
obscurantismo vão às ruas com seus cantos de sereia, e também são detratados sem qualquer pudor médicos cubanos, aqui
vindos para colaborar com a boa saúde do pais, é inevitável concluírmos que o
Dops teve um final feliz: Não acabou no Irajá, como se diz de alguém que pretendia ser Greta Garbo, mas ao fim
sobreviveu à ditadura e, feito ambulante, trabalha nas avenidas do Brasil.